A IGREJA, O CÓDIGO CIVIL E O BATISMO DE CRIANÇAS

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A IGREJA, O CÓDIGO CIVIL E O BATISMO DE CRIANÇAS



Recentemente uma criança de oito anos de idade que havia assumido um compromisso espiritual com a fé cristã numa Igreja evangélica foi impedida por seu responsável legal de efetivar seu desejo de se batizar, ou seja, demonstrar publicamente sua fé, eis que seu pai não autorizou o pastor a realizar a cerimônia religiosa.



É vital destacar que o batismo é essencialmente um ato espiritual, qualquer seja a orientação religiosa, e o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê o direito da criança a escolher sua religião, sendo esse um ato de fé individual, quando tem conseqüências tão somente religiosas, independente de sua capacitação legal, devendo ser respeitado pelos responsáveis legais.



Há alguns anos, foi compartilhado por um Juiz Cristão, num Seminário Jurídico, realizado na Sede da CPAD - Casa Publicadora das Assembléias de Deus, que a justiça de Pernambuco autorizou o batismo de uma criança, filho de evangélicos, na religião afro-candomblé, em atendimento disposto ao Estatuto da Criança e do Adolescente.



Registre-se que as Igrejas e Organizações Religiosas utilizam-se três principais sistemas de governo eclesiásticos, que são: episcopal, presbiteral, congregacional ou misto, estabelecendo para seu funcionamento administrativo-eclesiástico, estando estes fixados no Estatuto Associativo da Instituição de Fé.



Destaque-se que no sistema episcopal, exceto os líderes eclesiásticos, numa administração centralizada, os fiéis não têm qualquer comprometimento jurídico e sim tão somente espiritual, e no presbiteral, os membros geralmente elegem um grupo de gestores para os aspectos administrativos e eclesiásticos, numa administração representativa, sendo o menor de idade é considerado membro da Igreja ou Organização Religiosa, mas não associado eclesiástico, assumindo a condição de fiel, contudo sem possuir qualquer obrigação legal.



O batismo nestas Igrejas ou Entidades Eclesiásticas tem tão somente a finalidade espiritual, aplicando-se aí integralmente o previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, no sentido da opção de fé do menor, que deve ser respeitada pelos pais, eis que resguardada pelo judiciário como direito fundamental a liberdade religiosa.



O Código Civil estabelece que o menor de dezesseis anos, e o maior de dezesseis e menor de dezoito anos, são, respectivamente, absolutamente incapaz e relativamente capaz, para os atos da vida civil, sendo o primeiro representado, e o segundo assistido, por seus pais, e associar-se a uma Igreja, que é uma pessoa jurídica de direito privado, é um ato da vida civil, com conseqüências jurídicas para a sociedade civil.



Por isso, o menor de idade, até completar dezoito anos, necessita da expressa autorização de seu responsável legal, para adentrar através do batismo a membresia de uma Igreja que adote o sistema congregacional, tornando-se um associado eclesiástico, sem, contudo, poder votar ou ser votado nas assembléias deliberativas com implicações jurídicas, com direitos e deveres previstos no Estatuto Associativo, como contido no Código Civil.



E, aí nas Igrejas que se caracterizam pelo sistema de governo eclesiástico congregacional a pessoa que se batiza adentra legalmente a membresia, passando a ser um associado eclesiástico, eis que nestas a estrutura administrativa é caracteriza pela efetiva participação democrática dos membros civilmente capazes em suas decisões jurídico-eclesiásticas.



Desta forma, as Igrejas ou Organizações, quaisquer sejam seus sistemas eclesiásticos, devem precaver-se obtendo dos representantes legais das crianças ou adolescentes autorização por escrito favorável ao batismo, quer ele represente tão somente uma decisão espiritual, ou também uma decisão associativa, inclusive, porque a orientação bíblica é da honra ao pai e mãe, que implica no princípio da obediência espiritual.



Procedendo assim o pastor-presidente da Igreja, que é um organismo espiritual à luz da Bíblia Sagrada, mas também uma organização jurídica, com Estatuto Associativo regulado pelo Código Civil, resguarda a Instituição de Fé.



Gilberto Garcia é Advogado, Pós-Graduado, Mestre em Direito e Conselheiro Estadual da OAB/RJ. Autor dos Livros “O Novo Código Civil e as Igrejas” e “O Direito Nosso de Cada Dia”, e Co-autor na Obra Coletiva “Questões Controvertidas – Parte Geral do Código Civil”, Vol. 6. Editora Método. Site: www.direitonosso.com.br